O café, item essencial na mesa dos brasileiros, tem se tornado um produto cada vez mais caro nos últimos meses. O preço do quilo ultrapassa a marca dos R$ 50 em algumas marcas, refletindo uma alta expressiva no valor da saca de 60 kg paga aos produtores. Segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da USP, o aumento foi de 152% em um ano. Em fevereiro de 2024, o café arábica era cotado a R$ 1.014,93, subindo para R$ 2.565,86 neste mês. Especialistas alertam que o cenário de preços elevados deve continuar.
Apesar de especulações em redes sociais, especialistas reforçam que o governo federal não tem influência direta na alta dos preços. O aumento está relacionado principalmente às condições climáticas adversas, com longos períodos de estiagem em 2023 e 2024. O presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Sistema Faemg Senar), Antônio Pitangui de Salvo, explica que a seca prolongada e as altas temperaturas afetaram severamente a produção.
"Isso impacta muito a cafeicultura, que é uma cultura perene. Além da seca, tivemos temperaturas elevadas, que reduziram ainda mais a produção. Além disso, anos anteriores também registraram condições climáticas desfavoráveis, como granizo e chuvas irregulares", destacou.
Salvo acrescenta que outros fatores contribuíram para a alta nos preços, como a desvalorização do real e o aumento dos custos de produção e de mão de obra. Além disso, o consumo mundial de café aumentou, com a China se consolidando como um dos principais mercados consumidores.
O presidente da Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic), Pavel Cardoso, ressaltou que o Brasil não foi o único país afetado. Vietnã e Colômbia, dois dos maiores produtores mundiais, também sofreram com eventos climáticos extremos. Em 2023, o El Niño trouxe calor excessivo e estiagem, enquanto tempestades severas castigaram as plantações no ano seguinte.
"Esses fenômenos climáticos impactaram diretamente a colheita deste ano, reduzindo a oferta global de café", explicou Cardoso.
O cenário não é otimista para os consumidores. Segundo ele, a alta nos preços deve continuar nos próximos meses. "As indústrias receberam aumentos superiores a 200% nos últimos 12 meses, mas repassaram apenas 79% para os supermercados, que por sua vez reajustaram cerca de 39% para os consumidores. Isso significa que novos aumentos ainda estão por vir", alertou.
Outro fator que deve manter o café caro é a expectativa de menor produção. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) projeta uma queda de 4,4% na safra de 2024, com impacto maior no café arábica, cuja produção pode cair 12,4%. André Braz, coordenador dos Índices de Preços do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), explica que a oferta reduzida pressiona os preços.
"O café é um item de grande demanda nacional. Quando a oferta cai, os preços sobem. Além disso, o ciclo da cafeicultura é bianual, alternando entre safras mais fortes e mais fracas. Em 2023, esperava-se uma safra maior, mas a La Niña prejudicou a produção. Em 2024, tradicionalmente um ano de menor colheita, os estoques já estão baixos, o que mantém os preços elevados", analisou Braz.
Diante do cenário desafiador, a indústria cafeeira busca alternativas para mitigar os impactos da alta dos preços. O presidente da Abic sugere que o governo utilize o Fundo de Defesa da Economia Cafeeira (Funcafé) para ajudar na estabilização do setor. Para a safra 2024/2025, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) autorizou um aporte de R$ 6,8 bilhões.
"A indústria enfrenta dificuldades devido aos altos custos e ainda não conseguiu repassar todos os reajustes aos supermercados. É essencial que o Conselho Deliberativo da Política do Café direcione recursos para que as empresas consigam recompor seus estoques e manter a produção", afirmou Pavel Cardoso.